
Ubriaco pensando no vinho Brasileiro
Ubriaco pensando no vinho Brasileiro
Saio par andar com os cachorros nesse calor um tanto exagerado que ajuda a entender como no Brasil é difícil acontecer algo antes do carnaval…
Volto e resolvo abrir os e-mails e mensagens de WhatsApp na esperança de algo novo. Nada, apenas uma mensagem de um amigo e seguidor, o Fernando Augusto que me diz: “Didú, como você conhece do assunto e é sincero nas suas opiniões, queria que me dissesse o que falta para o vinho brasileiro?”
Prometo responder a ele em um futuro Dicas do Didú e resolvo ir tomar um sol e ler alguma coisa enquanto bebo um vinho branco com gelo e água com gás… coloco Cole Porter no Spotify e fico curtindo o não fazer nada num país tropical em véspera de carnaval…
Eu adoro o Sol. Basta ver essa foto acima e ver a tonalidade da minha pele que assusta a qualquer dermatologista… hahahahaha
Logo parto para a segunda garrafa e o slide do Fernando Augusto me perguntando do vinho nacional não para de passar na minha mente… vai pra lá, vem pra cá e logo minha cabeça começa a trabalhar nisso, completamente liberada pelo meu estado ubriaco…
Então vamos lá. São diversas coisas e vou tentar enumerar…
- Não há a cultura do vinho no Brasil. Aqui a cultura é da cerveja e da caipirinha. Cultura do vinho há apenas no vinho de mesa, líder de mercado, com mais de 50% do que se vende de vinho por ano. Ele tem a cultura e o preço baixo.
- O governo não ajuda e ainda atrapalha com muita burocracia e muitos tributos. Para se ter uma idéia, no Brasil para se construir uma vinícola, tudo custa no mínimo o dobro do que nos países vizinhos e depois, com o vinho pronto, na hora de vender, ele tem um peso de cerca de 55% de tributos na saída da vinícola, nos países vizonho é menos da metade disso…
- Os “líderes” do setor entendem que o problema do vinho fino brasileiro que nunca sai dos 6% de participação é o vinho importado. Isso ou é burrice ou maldade. Não é outra explicação. Eu acho que é maldade e explico no próximo ítem…
- Esse “lideres” que são líderes de araque (ainda se fala isso?… hahahahahaaaa), pois se você entrar nas páginas dessa turma que manda na grana e no lobby da indústria do vinho nacional, estou falando de Uvibra, Consevitis, e que tais, você vai ver que se trata de uma minoria que absolutamente não representa de fato nem as mil vinícolas do Brasil nem as 18 mil famílias que plantam uvas. Eles não ajudam o setor e não agregam. Considero-os uma fraude total.
- O produtor de uva pode vender sua uva para o produtor de vinho (que é CNPJ), mas não pode fazer vinho com suas uvas e agregar valor ao seu trabalho (1 quilo de uva a R$ 2,00 pode se tornar uma garrafa de vinho a R$ 30,00 facilmente), pois a lei do vinho o proíbe disso. Ele só pode vender esse eventual vinho para pessoas físicas e em seu estabelecimento, ou em feiras regionais… Piada né? Ou seja, a uva ele pode vender para CNPJ mas o vinho não? Se ele fizer uma preciosidade não pode vender para um restaurante ou uma loja. Qual o nome disso? E por que não mudam? Assim nunca teremos produtores artesanais no Brasil.
- E pior, o MAPA obriga inúmeras e desnecessárias exigências para esse produtor de uva montar sua pequena vinícola. exigências que beiram o ridículo e que fechariam a Bourgogne que fossem exigidas lá… levando a custos absolutamente impossíveis para um pequeno produtor de uvas.
- Não mudam pois o Brasil é acomodado. O pessoal é desunido, especialmente o gaúcho, inimigos uns dos outros, um fala mal do outro. Um pecado isso. Se fosse unidos, assumiriam as entidades que vivem da grana do ICMS do transporte de suas uvas e derivados dela e trabalhariam pela mudança disso. Mas quem quer mudar? E a grande indústria, deixaria isso acontecer?
- O vinho de mesa como vimos não tem problema algum, é líder de mercado e paga a conta dessas entidades que não trabalham para ele, mas para o vinho fino. Eu acho errado, mas quem é o Didú para achar algo? Um Ubriaco divertido que fala o pensa?… Porém essa entidades só investem nos vinhos finos que têm apenas 6% do mercado. Está certo?
- E o que há de errado com os vinhos finos? Ora, muita coisa;
- O brasileiro não tem o hábito do consumo do vinho como complemento alimentar. 1 taça por refeição. E não tem grana para fazer isso, pois vinho fino é ao menos o dobro ou o triplo do valor do vinho de mesa.
- Na mesa da cozinha de qualquer europeu você encontrará uma garrafa de vinho aberta, não há almoçar o jantar sem um copo de vinho. Isso é cultural e nós não temos isso. Isso precisa ser construído.
- Essa construção se faz com comunicação, mas essas entidades que cuidam dessa grana não apoiaram por exemplo o projeto da Provinho que tenta justamente mudar esse panorama com comunicação… Que tal?
- Depois a quase totalidade dos vinhos finos brasileiros não têm personalidade. Sorry, mas eles querem ser chilenos ou italianos ou franceses. Eles se entopem de madeira. Eles não são o que deveriam ser, eles não mostram sinceridade, não representam seu terroir, sua aptidão de chuva, de fruta de frescor. Insistem em extração e barrica. Falta personalidade. Basta ver o sucesso dos nossos deliciosos espumantes que têm personalidade e nunca precisaram de proteção política em relação aos importados, pois têm preço e qualidade com autentiucdade…
- Claro que no vinho fino falo da grande maioria, pois há muitos pequenos e maravilhosos produtores, como Lizete Vicari, Era dos Ventos, Vinhos da Rua do Urtigão, Zenker, Sacramentos, Entre Vilas, Daniel Lopes, Marco Daniele, Serena, Boroto, entre muitos outros, mas que são os artesanais. Se se vê isso nos grandes. De vez em quando aparece uma iniciativa como o Gamay e o Trebbiano Wild da Miolo, mas é apenas para mostrar que sabem fazer. Eu acho errado e a resposta do mercado com essa participação que nuca sai dos 6% comprova isso.
- O modismo da poda invertida agora então é o que mais se fala. Claro que de Domex, proibido em todo mundo, ninguém fala, claro que tomar syrah e sauvignon blanc todos iguais com a consultoria dos mesmos enólogos, parece muito legal se houver um bom respaldo na comunicação, no “storytelling” e no papo que no fundo vai levar público para o eno-turismo e até vai contribuir no hábito do vinho, mas garanto que a maioria não vai fazer dinheiro com vinho não… Só quando se começar a fazer vinho com as próprias leveduras e se achar alternativas saudáveis para o dormex é que posso acreditar num futuro de vinho de verdade de dupla poda.
Então, meu caro Fernando Augusto, enquanto não convencermos os cerca de 50 milhões de brasileiros que afirmam tomar vinho, que eles deveriam tomar 1 taça por refeição, e enquanto o vinho brasileiro não priorizar sua personalidade, nós não teremos um mercado consistente. É apenas a opinião do Didú Ubriaco…gora estou aliviado… ao menos me livrei desse slide que não parava de passar na minha cabeça… vou voltar para o sol…