Castas Patrimoniais – Chile uva Pais
Desde que o homem produziu vinho há nove mil anos atrás, sabe-se que as videiras sofreram mutações e casamentos genéticos espontâneos e foram se adaptando a diferentes terroirs, solos, latitudes, temperaturas, exposições, altitudes, sistemas de condução, a rasteira, em trepadeira em arvores, em pergolados, gobelet, gouyot, cordone speronato, espaldeiras, etc., foram criando diversas vitis.
A religião desempenhou um papel importante no estabelecimento e disseminação da vitivinicultura antiga, pois, para os egípcios, o vinho estava associado ao Deus Osíris, para os gregos, ao Deus Dionísio, para os romanos, ao Deus Baco e para os babilônios, à Deusa Siduri.
Bacco
Os romanos levaram o vinho como uma forma de impor os seus costumes e cultura nas terras que conquistavam. O vinho forçava o homem a ficar na terra, isso amansava os ânimos e produzia vinho que seria levado a Roma, não esqueçamos que o vinho foi pagamento e foi moeda de troca…
A disseminação da vitivinicultura acompanhou essa expansão do império romano, primeiramente nas áreas costeiras do Mediterrâneo e depois, em direção ao interior, seguindo as principais rotas de comércio através dos rios Reno, Rhone, Danúbio e Garonne, alcançou a Grã–bretanha, Germânia, e por fim a Gália, que mais tarde seria a França. E as vinhas indo para todos os lugares…
Não foi diferente com o novo mundo, pois a igreja, proprietária de extensos vinhedos nos mosteiros, onde o vinho era produzido para o sacramento da eucaristia e para o sustento dos monges. Não nos esqueçamos que no passado as missas ofereciam o pão e o vinho, era uma forma de atrair seguidores numa época onde a comida era difícil. Hoje só os padres bebem o vinho e o pão virou uma óstea, mas no passado não…
Assim, foi disseminado através das cruzadas e no século XV se estabeleceu nas ilhas das Canárias e Madeira, atingindo posteriormente a África do Sul, Austrália e América. O crescimento do islamismo no norte da África, Espanha e Oriente Médio também teve um papel importante na expansão da vitivinicultura.
Então, hoje encontramos uvas que são autóctones (aquelas que são originárias daquele lugar) e outras que são patrimoniais, pois de tão antigas e tão arraigadas na cultura da população se tornaram emblemáticas daquele lugar.
A uva Pais era a espanhola Listán Prieto de Castilla La Mancha que se dizimou com a Philoxera mas que fora pelas rotas dos jesuítas para as ilhas Canárias e de lá para as Américas, onde tomou diversos nomes, como Criolla Chica, El Paso, Hariri, Listrão, Misión, Mission’s Grape, Negra Antigua, Negra Corriente, Negra Peruana, País, Palomina Negra, Rosa del Perú, Uva Chica negra, Uva Negra, Uva Negra Vino, Uva Tinta, Viña Blanca, Viña Negra. Listán Prieto é também confundida com Jacquez, Listán Negro e Negramoll. E ainda com Moscatel Negro, que os missionários espanhóis frequentemente plantavam ao lado de Listán Prieto ao estabelecerem suas missões. Isso quem diz é a competentíssima Jancis Robinson, Jose Vouillamoz e Julia Harding do excepcional Grapes.
Colheita com escadas
Estou falando de Pais por conta do vinho Bouchon País Salvaje que é feito com uvas País que vêm de vinhas selvagens que cresceram livremente entre a flora selvagem da propriedade Mingre na Viña Bouchon, na área de Maule secano. Vinhas com mais de cem anos que nasceram espontaneamente pelos pássaros!…
Estas vinhas bravas nunca tiveram qualquer intervenção humana; cresceram e escalaram entre as espécies nativas que abundam nas ravinas e serras, como a rosa mosqueta, o peumo (fruto chileno) e o quillay (flor chilena). Suas uvas representam a mais pura expressão de crescimento orgânico e sustentável. A colheita ocorre na última semana de abril e deve ser feita por meio de escadas, colhendo cachos de até cinco metros de altura.
Esse vinho me remeteu a escrever sobre a Pais, uma uva patrimonial do chile que hoje graças a deus e a tantos dedicados produtores, está sendo tratada com o devido respeito.
Os Buchon, especialmente essa nova geração que se dedica a vinhos de cultivo orgânico, de fermentação espontânea e sem passagem por madeira, estão oferecendo alguns exemplares que além de deliciosos, são didáticos pois são inimitáveis na expressão verdadeira do terroir.
Uvas desengaçadas em “Sarandas”
Esta garrafa tem também o talentoso e apaixonado enólogo Christian Sepúlvedra. O vinho tem 12º de álcool e custa R$ 198,00 na World Wine. Você tem que provar…
Um último lembrete a você, vinhos assim sem intervenção não são para serem avaliados por nós, pois não temos competência para isso. Eles são feitos para nos ensinar com sua autenticidade e pureza, o que é aquela casta, naquele lugar. Aprenda com ele e curta suas impressões… eu adorei.