O Cuscuz do Velório…
Bem, se você se interessa por cuscuz, primeiro leia a crônica do meu Amigo Dias Lopes, que secondo me, é o melhor texto do jornalismo gastronômico. Uma enciclopédia. Ele contou tudo sobre o prato AQUI, ou quase tudo… por que ele não sabia desse cuscuz e a história por trás dele…
Eu trabalhei muitos anos na Editora Abril, quando ela era A Editora Abril. E trabalhei em Veja quando ela era A Veja… nessa época meu chefe era meu Amigo Antonio Sabino de Souza Neto.
Nos aniversários do Sabino ele sempre me convidava para comemorar em sua casa onde havia amigos e parentes, onde se bebia bastante e onde sempre havia o Cuscuz da Dona Odete, a Mãe do Sabino, que me adorava, curiosamente, pois eu sempre desbocado e falador e ela recatada fina, muito educada. e eu adorava seu cuscuz e dizia isso.
Bem, meu gosto pelo prato e a simpatia dela por mim foram tão explícitos, que em todos os aniversários do Sabino, eu ganhava uma forma menor de cuscuz para levar para casa… para ciúmes do filho, claro… hahahahaaa.
Bem assim foi durante anos, eu saí de Veja e fui para a diretoria de Marketing da Editora, até que um belo dia eu estava na minha sala ( sim… havia isso naquela época… sala decorada com minhas coisas e eu podia fumar meus charutos em paz… privilégios que nunca voltarão às grandes empresas.), e entra minha secretária e anuncia: Didú, faleceu a Mãe do Sabino.
Bem, desmarquei minha agenda liguei para a Nazira, fui buscá-la e nos dirigimos para o velório na Beneficência Portuguesa. Velório é aquela coisa… todos ali, aquele clima, abraços apertados, alguns que surtam no caixão, outros que desmontam, etc., o da Dona Odete não seria diferente, como não seria diferente também, que chega uma hora em que todos vão embora, a noite cai e ficam apenas os parentes mais frequentes e os Amigos de verdade.
O assunto acaba, todos cansados, eu ao lado do Sabino me lembro do Cuscuz… e pergunto: Sabino, alguém ficou com a receita do Cuscuz?… Bem, minha pergunta teve o efeito de uma injeção de álcool canforado no meu Amigo que se levantou com as mãos na cabeça e falou alto!: ” O Cuscuz!!!! O Cuscuz!!!! Gente! Quem ficou com a receita do cuscuz?!!!!” hahahahahaha
Bem, as filhas, primas, tias, todas tinham cada uma uma lembrança de alguma dica importante: “Eu me lembro que ela usava cavalinha e não sardinha” dizia uma “Eu sei que ela nunca contou pra ninguém mas além do refogado ela punha uma lata de Pomarola mesmo…” e assim foi por uma meia hora e a Nazira ao meu lado anotando tudo num caderninho…
Bem, no primeiro fim de semana testamos a receita em casa e chamamos o Sabino, que passou a ter o direito de ser convidado em todos os próximos Cuscuz que ele aprovou com louvor. O cuscuz passou a ser chamado Cuscuz do Velório… e todas as vezes que a Nazira fez esse prato, os convidados tinham que ouvir o chatododidu contando tudo outra vez…
O Cuscuz então acabou virando o Cuscuz da Nazira por anos a fio, até que ela também morreu. Mas por sorte não se precisou anotar no velório dela que inclusive não teve velório, pois eu já havia anotado tudo para uma crónica que escrevi em um jornal de bairro que o próprio Sabino era o responsável e me pediu que contasse a história divertida.
Esta semana depois de quase dois anos sem comer Cuscuz, resolvemos arriscar. Compramos os peixes e camarões no Montoza Pescados e partimos para a receita, porém agora, com o Ramatis (o Nobre), que é absolutamente radical nas coisas naturais, alguns ingredientes foram substituídos, como você pode ver na receita lá embaixo. Neste link AQUI. você pode ver o vídeo com o passo a passo, mas para quem preferir abaixo está a receita daquele que já foi o Cuscuz da Dona Odete, depois o cuscuz do Velório, depois o Cuscuz da Nazira e agora é apenas o nosso Cuscuz..
Cuscuz – Receita
Fazer um caldo com 4 camarões grandes, uma cabeça e espinha de Salmão (não usamos salmão em nossa receita, mas qq outro peixe) e dois porquinhos (peixe pequeno que tem pouco espinha) 1 cebola grande picada, cinco dentes de alho, algumas ramas de salsinha e de coentro, dois caldos de galinha e um caldo de camarão (estes foram cancelados na nossa recita por serem muito artificias). Esse é o melhor momento de colocar o sal, considerando que depois as farinhas vão amenizá-lo. Salgar depois não é fácil.
Depois de cozido limpar tudo, coar o caldo e reservar. Numa panela onde refogar em azeite, 3 cebolas grandes picadas, 3 dentes de alho, 4 tomates picados sem sementes, colocar duas latas de Pomarola tradicional (foi cancelado em nossa receita e substituído por polpa de tomates orgânicos), 2 latas de Atum, se quiser 2 latas de sardinha e juntar o caldo.
Nesse caldo juntar aos poucos farinha de milho (aquela em flocos) e Polentina (esta dá textura bem molinha) (a Polentina também descartamos em nossa receita) e também farinha de mandioca torrada. Tem que colocar aos poucos e ir mexendo sempre para não empelotar, acrescentar palmito picado e azeitonas verdes picadas, salsinha e coentro picados e uma pimenta vermelha. Ela disse que não fica picante e o último tinha (fique sossegadas…), . Essa proporção das farinhas ela não sabe dizer, tem que ir vendo aos poucos, mas mais da de milho em flocos.
Quando estiver quase no ponto, juntar 1 quilo de camarões pequenos escaldados.
Untar as formas e enfeitar com ovos cozidos, tomates em rodelas e camarões grandes cozidos e acrescentar a massa. Depois é só desenformar. Saúde!