As histórias do Vinho
O Mundo do Vinho está repleto de histórias e curiosidades. Eu em minhas palestras sempre conto algumas e sempre ironizo com o comentário de que secondo me, a maioria é mentira…
Meu Amigo Luiz Horta, certa vez numa entrevista que fiz com ele nos tempos de meu programa Celebre! na CNT, me saiu com uma frase que uso sempre: a ciência sempre estraga a poesia… adorei.
Ele se referia `a suposta origem da uva albariño, como sendo a riesling que teria sido levada para a Espanha por um senhor não identificado e que lá ficou conhecida como Alba Rehein, ou seja, a branca do Reno… Alba Rehein = Albariño… Muito plausível, mas aí veio a ciência e acabou com a poesia… PUUUUÔÔÔÔÔUUUMMMMMM.
Da mesma forma inúmeros estudiosos do vinho citaram em seus livros, eu inclusive, que a uva Syrah teria sua origem na antiga cidade Persa de Shiraz e teria sido trazida para ao Rhone por um cruzado. Havia até o nome do cruzado e a origem do vinho Hermitage La Chapelle, pois ele havia se enclausurado em voto de silêncio… História linda e cultuada por tantos e que deleitava meus ouvintes de palestras… mas, veio a ciência e acabou com a poesia… descobriu-se por exames de DNA que a uva é mesmo autóctone do Rhone… PUUUUÔÔÔÔÔUUUMMMMM.
E assim caminha a coisa, com a ciência fazendo das suas e mesmo pesquisadores, descobrindo documentos que desmitificam fatos históricos dados como verdadeiros.
Meu amigo Eugênio Oliveira do blog DCV, publicou em seu Instagram, uma relação enorme de informações que desmontam o mito Don Pérignon como criador do Champagne, com informações baseadas no livro Bursting Bubbles do Robert Walters.
Dom Pérignon foi um monge, mestre de adega, na Abadia Haut Villers Abbey entre 1668 e 1715. Ele não foi o criador do Champagne espumante. Não há um único registro na Abadia, que nesse período tenha sido feito qualquer vinho espumante por lá. Nesse período, os registros mostram que a esmagadora maioria dos vinhos era comercializado em barris, logo não poderiam ser espumantes; e os vinhos engarrafados eram vinhos tranquilos.
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Dom Pérignon trabalhou duro, assim como a maioria dos mestres de adega da época, para evitar que a pequena quantidade de vinho engarrafado tivesse gás, considerado um grande defeito. Ele esteve envolvido em um número de práticas nas vinhas e nas adegas que geraram incrementos de qualidade e sob seu comando os vinhos da Abadia foram altamente considerados e vendidos por altos preços, mas eram vinhos tranquilos (sem gás).
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Outro fato irreal é de que Dom Pérignon foi o primeiro a usar rolha como vedante. A cortiça já havia sido usada pelos gregos e romanos para vedar ânforas, e os ingleses já vedavam vinhos tranquilos e Cidra, 100 anos antes de Dom Pérignon nascer. Aliás, Champagne não foi o primeiro espumante francês. O espumante de Limoux foi feito em 1531, 150 anos antes do primeiro vinho espumante ter sido feito em Champagne.
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Outro mito é de que Dom Pérignon foi o primeiro a fazer um Champagne Blend (de vinhos de uvas diferentes). O que houve foi que em 1732 ele foi creditado pelo padre Plunche por ter misturado uvas de vários lugares na prensa, e na sua biografia saiu como “blending the grapes”, criando um novo fato irreal.
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Então como Dom Pérignon se tornou sinônimo de Champagne ????.
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A maioria dos mitos criados começaram com Dom Grossard, que vem a ser o último tesoureiro de Haut Villers Abbey. Rebaixado ao nível de padre da paróquia, após a Revolução Francesa, ele estava determinado a romantizar e glorificar o trabalho da Abadia. Grossard não foi contemporâneo de Pérignon e estava escrevendo 100 anos após sua morte.
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Dom Pérignon não era cego e nunca disse a frase “Estou bebendo estrelas”. Essa frase…só surgiu, pela primeira vez, em um anúncio impresso no século 19, mais de 100 anos após a morte de Dom Pérignon.
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A lenda de Dom Pérignon se alastrou pelo século seguinte e o mito se tornou real quando em 1889 o Sindicato do Comércio e dos Vinhos de Champagne, via seu corpo promocional, declarou Dom Pérignon o pai do vinho espumante, reafirmando muitas das falsas realizações atribuídas a ele.
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A história de Dom Pérignon acabou sendo indispensável para a propaganda da região. Os marqueteiros souberam vender a história do “monge cego que bebeu estrelas”. Moët e Chandon entendeu melhor e legitimou a lenda criando uma cuvée Prestige “Dom Pérignon” e em seu site diz que Haut Villers Abbey foi onde o Champagne nasceu. Ah! Existe uma estátua de Dom Pérignon em Champagne que também não é fiel ao fato, pois não existe uma só imagem registrada de Dom Pérignon…